quarta-feira, 28 de abril de 2010

Hidrelétrica de Belo Monte não é a melhor opção



28/04/2010 - 02h04
Por Beth Munhoz



Com metade do custo, geração por biomassa garante maior produção.

A batalha judicial que vem sendo travada em torno do leilão para a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte deixa para trás um debate que já deveria estar em pauta por autoridades, especialistas e ambientalistas: o Brasil pode usar seu potencial para gerar energia a partir de biomassa. Além de menos poluente, a geração de energia a partir de biomassa possui números mais atrativos. Enquanto a hidrelétrica Belo Monte produzirá algo em torno de 4.500 Megawatts (MW), pois a vazão do Xingu limita a capacidade total de 11.233 MW, a falta de incentivo para a biomassa deixa de gerar 5 mil MW por ano. Considerando para tal o investimento de R$10 bilhões – quase metade do custo previsto pelo governo –, o tempo para o início de operação e o impacto positivo deste processo ao meio ambiente, certamente a biomassa é uma fonte mais rentável. “Em dois anos, se houver decisão política, será possível produzir 5 mil MW, enquanto que a primeira fase da Belo Monte está prevista para entrar em operação em 2015, e a segunda, em 2019”, avalia o advogado Luiz Piauhylino Monteiro Filho, do escritório Piauhylino Monteiro Sociedade de Advogados, especializado no setor energético.

“Priorizar o potencial já existente é uma alternativa muito mais simples e econômica do que a construção de uma termelétrica”, diz Luiz Piauhylino. “Ao invés de investir em termelétricas, que são mais poluentes e caras, o governo deveria priorizar a bioeletricidade, gerada a partir do bagaço da cana. Está havendo uma inversão de valores”, afirma.

Sem entrar no mérito político da questão, Luiz Piauhylino considera bem-vinda qualquer medida que se adote para impedir o risco de apagão. “Só que há formas e formas de agir. E, seguramente, construir termelétricas não é a mais adequada, e deveria ser utilizada só em último caso.”

Luiz Piauhylino defende uma mudança de postura de instituições financiadoras federais com relação ao setor sucroalcooleiro: “Elas deveriam tratar o setor com mais atenção e agilizar a análise de projetos e a liberação de investimentos, trâmites que levam no mínimo um ano para uma decisão”. Sem investimentos, o setor sucroalcooleiro deixa de gerar 14 mil megawats de energia, o equivalente a uma Itaipu.

Ao incentivar o uso de matéria-prima fóssil para gerar energia — o bagaço da cana numa caldeira gera vapor e, consequentemente, energia —, o Brasil não só estará aproveitando todo o seu potencial nessa área, como irá engajar-se ainda mais nas discussões envolvendo a defesa do meio ambiente. “Quando o mundo debate alternativas renováveis para a defesa ambiental, o Brasil ainda gasta com construção de termelétricas a gás, óleo diesel ou a carvão. Está perdendo a oportunidade de modernizar a geração de energia a partir de biomassa. Embora a iniciativa seja certa, o caminho é que está errado”, avalia.

Estratégico para o governo, o setor sucroalcooleiro hoje tem um crédito de R$ 15 bilhões para receber do governo federal, como também deve ao poder público. “Este é o momento de acerto de contas, de passar a questão energética do país a limpo”, ressalta. “A questão é simples, basta mandar acertar os direitos creditórios oriundos da Lei 4.870/65. Dessa forma, as usinas pagariam o que devem à União em tributos, e ao Banco do Brasil, em financiamentos atrasados.” Com o saldo, atesta o especialista, realizariam novos investimentos para, assim, enfrentar multinacionais, que, “por valores abaixo do mercado”, estão adquirindo e controlando as usinas brasileiras. “A continuar a atual situação, em cinco anos, o setor sucroalcooleiro do Brasil deverá estar sendo controlado por apenas dez grupos econômicos estrangeiros”, alerta Luiz Piauhylino Monteiro Filho.


(Envolverde/O autor)

Superfície florestal mundial diminuiu 3,1% de 2000 a 2005. Brasil lidera lista de desmatamento




A superfície florestal diminuiu 3,1% entre 2000 e 2005 no mundo, segundo um estudo baseado em observações por satélites publicado nesta segunda-feira nos Estados Unidos, estimando que o Brasil foi o país que sofreu a maior redução de suas matas.

No total, a perda foi de 1.011.000 km2 de 2000 a 2005, o que representa 0,6% por ano. A superfície florestal mundial era de 32.688.000 km2 no início do estudo.

Por país, o Brasil, segundo em quantidade de área florestal (4,6 milhões de km2), atrás apenas da Federação Russa (5,12 milhões de km2), sofreu a maior redução de suas matas no período, 165 mil km2 (3,6% do total). Reportagem da France Presse.

Já o Canadá, com uma superfície florestal de 3 milhões de km2, ficou em segundo, com perdas de 160 mil km2, que representam 5,2% do total.

A perda bruta de superfície florestal é definida nesta pesquisa como produto de causas naturais, como incêndios provocados por raios, e atividades humanas.

Estimativas precisas são consideradas indispensáveis nos esforços de contabilização das emissões de dióxido de carbono (CO2), um dos principais gases de efeito estufa, e para elaborar modelos climáticos, explicaram os autores da pesquisa, divulgada pela Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos (PNAS).

Por região, as matas boreais, que se situam no Ártico e representam 26,7% da superfície florestal do planeta – a segunda mais importante – registraram a maior redução deste período em cinco anos (4%), dois terços dos quais se deveram a incêndios de origem natural, afirmaram cientistas das Universidades de Dakota do Sul (norte) e do Estado de Nova York (nordeste).

As matas tropicais úmidas, que cobrem 11,5 milhões de km2 e representam a maior superfície florestal da Terra, perderam 2,4% de sua superfície, o que equivale a 27% da perda total.

As florestas tropicais em zona seca – 7,13 milhões de km2, ou 21,8% das superfícies de mata do mundo – diminuíram 2,9% de 2000 a 2005, o que representou 20,2% das perdas florestais totais.

Já as matas das zonas temperadas – 5,2 milhões de km2 – ou 16,1% do total mundial em 2000, perderam 3,5% de sua superfície, 18,2% do total do planeta neste período.

Por continente, a América do Norte – com uma superfície florestal de 5,8 milhões de km2 em 2000 – sofreu a maior privação no período (5,1%, 295 mil km2), ou 29,2% da perda mundial.

Ásia e América do Sul perderam duas vezes menos em comparação com sua superfície de mata, 2,8% e 2,7%, respectivamente. Estes decréscimos representaram 23,7% e 22,6% do total entre 2000 e 2005.

Reportagem da France Presse, na Folha Online
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ambiente/ult10007u726201.shtml

Represa de erros



27/04/2010
Por Marina Silva*
http://www.envolverde.com.br/?busca=belo+monte&x=13&y=10#

Estão do que evidentes a complexidade e os riscos envolvidos na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu, no Pará.
Erros há 20 anos represados, sobram dúvidas e incertezas sobre a viabilidade econômica e a extensão dos impactos socioambientais do empreendimento.

Apesar de todas as manifestações em contrário, o governo se mantém indiferente. Fez-se o leilão semana passada e anunciou-se um vencedor, apesar da insegurança jurídica do processo e a fragilidade dos arranjos societários de última hora. Vê-se o direcionamento de todos os instrumentos de políticas públicas para viabilizar um projeto estrategicamente ruim, caro e de altíssimo risco socioambiental.

Enquanto isso, pouco se faz para reduzir perdas da ordem de 15% em energia no país, o equivalente a três vezes a capacidade média de Belo Monte. E o processo em curso aponta mais desperdício: Belo Monte terá uma produção energética efetiva bem menor do que sua capacidade total -4.428 MW, em função do regime hídrico do rio e da configuração do projeto, e não os 11.223 MW anunciados.

Surpreendem também as condições à disposição dos interessados em comercializar a energia gerada pelo rio Xingu. Tem-se R$ 13,5 bilhões em crédito subsidiado pelo BNDES, com prazo de 30 anos para pagamento, a juros de 4% ao ano.

Isenção de impostos sobre os lucros, o comprometimento do capital de empresas estatais e de fundos de pensão e, de quebra, o absurdo comprometimento de licenciamento ambiental com prazo preestabelecido para a obra começar já em setembro. Mesmo assim, as duas empresas privadas que melhor conheciam o projeto não participaram do leilão.

Preferem a posição de contratadas aos de investidoras, enquanto outras, vitoriosas, ameaçam desistir dos benefícios aparentemente irrecusáveis. Imaginem se todas essas condições excepcionais fossem para melhorias da eficiência do sistema elétrico e para redução da demanda por energia?

A política energética em curso é manca: apoia-se apenas no aumento da oferta sem investir na diversificação, na conservação e na gestão do mercado. Temos um sistema com elevadas perdas por desvio, manutenção precária e pouco incentivo para o uso de técnicas construtivas de maior eficiência energética. Definitivamente precisamos expandir a oferta de energia, mas não necessitamos, para isso, manter a cultura do desperdício e comprometer o patrimônio ambiental e os recursos do país, quando temos alternativas de geração.

*contatomarinasilva@uol.com.br


(Envolverde/O autor)

‘Belo Monte é a expressão e o significado do governo Lula-Sarney’



26/04/2010 - 08h04
Por Valéria Nader e Gabriel Brito*

Projetada no governo Geisel, a usina hidrelétrica de Belo Monte, bandeira energética do governo Lula, tem vivido um espetáculo da mais pura improvisação. Após incessantes decisões judiciais contra e a favor da obra, o leilão que consagrou o consórcio liderado pela Queiroz Galvão e Chesf durou apenas sete minutos, sobrepondo-se à notificação da justiça que o suspendia. Logo depois, a Queiroz decidiu abandonar o empreendimento, acontecimento inédito em leilões do gênero. Para finalizar, alguns perdedores poderão participar do empreendimento, não como sócios principais, mas nas obras de construção da usina, vez que o projeto está envolto em uma série de dúvidas relativas aos custos a serem incorridos. Já há uma fila de empreiteiras interessadas. É o cabaré da energia elétrica.

Para tratar deste que é um dos assuntos mais polêmicos dos oito anos do PT no poder, o Correio da Cidadania conversou com o professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, Célio Bermann. Bermann não poupou críticas, de todos os matizes, a um projeto que foi imposto contra a vontade das populações, através de caricaturais audiências públicas e fictícias referências de custo.

Para Bermann, a explicação para a obsessão por Belo Monte é a aliança Lula-Sarney, que abarca figuras historicamente ligadas ao setor eletro-intensivo, de forma a manter a subordinação da política energética nacional aos interesses de grandes corporações econômicas. Desse modo, estaríamos vendo o início de uma radicalização na apropriação das riquezas do território amazônico, que só pode gerar trágicas conseqüências ambientais e sociais.

Correio da Cidadania: Que balanço você faz da trajetória do projeto de Belo Monte, com toda a disputa política e guerra judicial que cercam o projeto? Como avalia o resultado do leilão, que culminou com a desistência dos principais concorrentes, a Odebrecht e a Camargo Corrêa, tudo indicando que o projeto deverá ser encampado pelo governo?

Célio Bermann: Primeiramente, eu não classificaria o resultado do leilão como uma vitória. Aconteceu que, apressadamente, a partir de novembro passado, o governo empurrou de forma obsessiva o projeto Belo Monte.

O resultado indica o seguinte: em primeiro lugar, o projeto será bancado única e exclusivamente pelo dinheiro público, através, primeiramente, do financiamento do BNDES, que deverá comparecer com 80% dos 19 bilhões de reais que custará a obra – custo que, no entanto, as construtoras e fabricantes de equipamentos eletro-mecânicos dizem não ser inferior a 30 bilhões.

Outro fato é que o consórcio vencedor é fundamentalmente formado por empresas públicas, estatais, o que se verifica na medida em que a Chesf representa 50% da composição acionária e o governo pretende também incorporar ao projeto, de forma efetiva, a participação acionária da Eletronorte, que por sua vez vai gerir a hidrelétrica. É toda uma engenharia financeira baseada fundamentalmente em renúncia fiscal exacerbada, com todas as conseqüências à população e aos contribuintes.

Dessa forma, estamos na iminência de assistir a um dispêndio de dinheiro público a ser administrado de forma absolutamente incompetente, porque o preço vencedor é totalmente fictício, uma vez que não é possível remunerar tal investimento com uma tarifa de 78 reais por cada 1000 kW/h.

Isso significa que, mais uma vez, haverá necessidade - para compensar os prejuízos, que serão assumidos principalmente pelas empresas estatais - de recorrer ao Tesouro Nacional a fim de se garantir que a energia seja suprida, principalmente para reproduzir e confirmar (e essa é a maior característica do projeto de Belo Monte) o modelo de apropriação do território amazônico, baseado na tomada de seus recursos naturais, de sua água, seus rios, para proporcionar a expansão de bens de alto conteúdo energético e baixo valor agregado.

Ou seja, faço referência às indústrias minero-metalúrgicas, de minério de ferro, bauxita e também sua primeira transformação, em aço e em lingote de alumínio.

Essa forma de "promover" o desenvolvimento da região amazônica e do país é absolutamente lesiva aos interesses da população brasileira.

CC: Além de perseguir um modelo de desenvolvimento inadequado sob os aspectos social e ambiental e dos custos elevadíssimos, o projeto é também criticado pela sazonalidade da usina no suprimento da energia e pelas incertezas geotécnicas que envolvem a obra. O que você acrescentaria a estes pontos que são destacados como grandes óbices para a efetivação desse empreendimento?

CB: Além da já mencionada questão da engenharia financeira, a idéia de que é preciso uma hidrelétrica para resolver o problema de habitação e infra-estrutura de uma cidade, de uma região, também aponta uma maneira absolutamente equivocada de entender os projetos de geração de eletricidade.

O principal benefício argumentado pelo governo é prover habitações de alvenaria e melhorias de saneamento, tratamento de água e esgoto para Altamira e região. Isso significa passar a responsabilidade das políticas públicas, que necessariamente devem ser assumidas pelos escalões da administração municipal, estadual e federal, para o empreendimento. Significa também a procura do governo por uma legitimação política, principalmente junto à população local mal informada.

CC: O que pensa sobre a avaliação de estudiosos de que o empreendimento de Belo Monte, com as reformulações pelas quais passou desde seu formato original, quando ainda era a usina de Kararaô, terá um impacto significativamente menor sobre o meio ambiente?

CB: O que aconteceu, em minha compreensão, foi que efetivamente houve a tentativa de levar em consideração o problema da amplitude do reservatório na concepção do projeto, com o artifício da construção de canais. Serão construídos dois canais de medidas significativas, de forma a comportar o volume de água que inicialmente estava estabelecido e ocuparia toda a região. Com isso, reduziu-se pela metade o reservatório, que antes era de 1200km².

Um problema significativo é que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) indica um reservatório de 400 km², enquanto o edital do leilão apontava um reservatório da ordem de 600 km². Aí também havia uma brecha por onde se poderia justificar o cancelamento do empreendimento, por não reconhecer o que tinha sido referência para a discussão ambiental. Se efetivamente haverá o aumento do reservatório, problemas sócio-ambientais de maior monta serão revelados. Portanto, seria fundamental reavaliar o projeto.

Mas o problema maior é que, na medida em que o projeto procurou reduzir as resistências ambientais, ao mesmo tempo em que manteve o dimensionamento da obra, ocasionou uma concepção absolutamente equivocada, que já determina sua ineficiência.

Agora ele está nas mãos de empresas estatais, pois as privadas saíram e não participam da tomada de empréstimos e dos investimentos, o que manteve a concepção de superdimensionamento da usina, de 11,2 mil mW, quando na verdade essa energia só estará disponível durante três meses ao ano. E haverá períodos de estiagem, entre setembro e outubro, nos quais a capacidade de geração se reduzirá a 1080 mW.

Frente a esse fato, o governo passou a trabalhar com a noção de ‘média de energia’, em torno de 4000, 4500 mW ao longo do ano, o que é uma maneira enganosa de caracterizar o empreendimento. A energia que estará garantida, independentemente do regime hidrológico, é de apenas 1000, 1100 mW. O restante da energia disponibilizada terá valor comercial menor.

Dessa forma, as empresas estatais (que deveriam ser públicas, mas não são) vão arcar com esse enorme prejuízo, que vai cair no bolso do brasileiro, e assim assistiremos ao prenúncio do processo de expansão do capital internacional na Amazônia: predatório, sem levar em consideração o interesse da população brasileira, especialmente as ribeirinhas, indígenas e tradicionais, fatalmente seguido da solicitação de construção de outras três usinas rio acima para melhorar a eficiência da usina e aumentar a disponibilidade hídrica, embora o governo indique que isso não acontecerá. No entanto, aponto como inexorável a necessidade de construção de outras usinas a montante, aí sim passando diretamente pelas populações da bacia do Xingu.

CC: Por que este governo é tão determinado em dar início a um projeto de custo elevadíssimo, em um país com variadíssimo potencial energético e com toda a resistência de entidades ambientalistas e movimentos sociais, inclusive com grande repercussão internacional? A quem se destina prioritariamente os benefícios desse projeto?

CB: Precisamos realmente qualificar que governo é esse que leva adiante de forma obsessiva o empreendimento, malgrado todas as análises críticas de movimentos sociais, ambientalistas, de acadêmicos e cientistas que fizeram aquele painel de especialistas para elaborar uma avaliação crítica aos estudos ambientais e à construção.

É preciso lembrar que essa obra é um arranjo político que constitui a expressão e significado do governo Lula-Sarney. Eis a referência que aponto.

O governo lulo-sarneysista tem interesses históricos na viabilidade de Belo Monte; todo o Ministério das Minas e Energia e a Eletrobrás de hoje estão constituídos pelos chamados homens-Sarney. São a esses, que mantêm relações históricas de privilégios com o setor eletro-intensivo, e às empresas minero-metalúrgicas, que politica e economicamente satisfaz um empreendimento dessa ordem.

Para o governo Lula e a candidatura Dilma fica o equívoco de identificar o projeto Belo Monte como estratégico, prioritário do PAC. Foi um equívoco determinado pela política de aliança do governo Lula.

Em minha opinião, esse erro pode gerar, em função das repercussões, uma insatisfação da sociedade e das populações locais em relação à condução do processo, fragilizando a própria candidatura. Eu analiso que Belo Monte, da forma como foi açodadamente conduzido, pode significar o cadafalso da candidatura Dilma.

CC: Vários estudiosos da área elétrica defendem, no entanto, o projeto como uma forma de aproveitar o potencial hidrelétrico brasileiro, já que o Brasil só teria utilizado até agora um terço desse grande potencial de energia limpa, proporção bem inferior à média dos países desenvolvidos. Qual a sua opinião quanto a esta avaliação?

CB: Essa percepção da hidroeletricidade de nosso país precisa ser redefinida. Nós temos hoje uma dependência excessiva da hidroeletricidade amazônica. O fato de mais de 50% de nosso potencial hidrelétrico estar localizado naquela região não significa, em absoluto, que todos os rios da Amazônia precisam ser transformados em jazidas de megawatts.

Tanto o projeto de Belo Monte como as usinas Santo Antônio e Jirau, do Rio Madeira, apontam a idéia que marca o pensamento elétrico, de se otimizar o aproveitamento energético desconsiderando as questões ambientais e sociais. E eventualmente, como em Belo Monte, procurando incorporar algumas dessas questões, mas mantendo a concepção de geração energética. Isso indica que não há compatibilidade entre preocupação ambiental, justiça social e o pensamento hegemônico de conduzir os projetos hidrelétricos da forma que vemos.

Em relação aos apoiadores da expansão hidrelétrica, devo dizer algo, sobre o qual Belo Monte é simbólico: primeiramente, a energia hidrelétrica ficará cada vez mais cara. Se levarmos em consideração a ordem e grandeza de 30 bilhões de reais de investimento, significa que o kilowatt instalado em Belo Monte está alcançando 2700 reais, cerca de 1500 dólares por kilowatt instalado, basicamente. Internacionalmente, o preço do kilowatt hidrelétrico instalado é de 1000 dólares. Estamos fazendo uma usina cara, contrariando a informação do governo e seus apoiadores de que se trata de projeto extremamente favorável no que se refere à relação custo/investimento e benefício.

Em segundo lugar, há o problema do destino da energia. Ela não será destinada às necessidades e requerimentos da população brasileira, não será voltada à melhoria de suas condições de vida no dia-a-dia e ao aumento da oferta de energia a essas pessoas.

CC: Segundo ainda esses mesmos estudiosos, fontes de energia alternativa, como eólica, solar, podem, sem dúvida, complementar a necessidade de suprimento, em vista de nosso variado potencial energético, mas não conseguiriam suprir significativamente as demandas de nossa matriz energética. O que você teria a dizer sobre essas energias alternativas?

CB: Essas outras fontes poderiam ter um aproveitamento melhor, como a biomassa também, o que poderia ser um complemento às fontes tradicionais, mas ainda se tem a compreensão de que são caras demais para receber investimento.

Mas é extremamente importante, antes de tudo, ressaltar alguns pontos. Um deles é a redução da perda de energia do sistema termelétrico: de acordo com dados do próprio governo, temos no Brasil uma perda da ordem de 15% do momento em que a energia é gerada, entra no sistema de transmissão, depois passa pela distribuição, até chegar à tomada dos consumidores.

Sem esquecer das características de prioridade à fonte hidráulica, não podemos imaginar reduzir essa perda ao que hoje é a média em países da Europa, Japão, EUA, onde ela fica em torno de 8%. Mas poderíamos imaginar reduzir as perdas a cerca de 10%. Daria pra ganhar 5% do que é gerado, disponibilizando esse montante para o consumo. Tal investimento é bem menor que a construção de uma nova usina.

Ao mesmo tempo, considero o fato de que o sistema hidrelétrico nacional apresenta condição diferenciada daquela existente nos locais citados, cuja matriz energética é extremamente dependente de usinas a carvão e gás natural, localizadas mais próximas do centro de carga e dos consumidores, o que possibilita uma menor perda também. A distância entre o local de geração e de consumo é determinante para operacionalizar um programa desse tipo. Por isso, em minha opinião, considerando as grandes linhas de transmissão do Brasil, levando energia elétrica de usinas hidrelétricas distantes do centro de carga e dos locais de consumo, nossa característica possibilitaria trabalhar com a redução de perdas, o que é uma conta teórica, mas que poderia levar a uma economia equivalente a dois terços do que se produz de energia em Itaipu.

Outra alternativa, para a qual chamei particularmente a atenção em 2004, e que teve resposta do governo apenas no ano passado, é a repotenciação de usinas hidrelétricas que operam há mais de 20 anos. Mas, nesse estudo feito pelo governo, a EPE – Empresa de Planejamento Energético - procura reduzir as conseqüências da repotenciação vistas historicamente e acaba super-dimensionando a capacidade de geração do parque hidrelétrico atual. Com isso, apontam uma escala de ganho extremamente reduzida por meio da repotenciação.

Neste momento, estou envolvido num trabalho de investigação e pesquisa junto a uma empresa de geração do estado de São Paulo para definir concretamente as possibilidades de redução de perdas nas usinas que operam hoje, de modo a conseguir aumento de energia por meio da repotenciação. Espero que esse trabalho se transforme numa discussão teórica, baseada em ganhos advindos da repotenciação e, por outro lado, em questionamentos sobre o super-dimensionamento do atual parque hidrelétrico por parte do governo. Espero reunir elementos suficientes para, de forma concreta, indicar as possibilidades que a repotenciação pode trazer.

CC: Todas essas possibilidades juntas não alcançariam o potencial elétrico que se projeta para Belo Monte de modo bem menos lesivo ao meio ambiente e à população? Por outro lado, até que ponto suprir esse potencial elétrico supostamente originário de Belo Monte é o foco que deve acompanhar as preocupações de uma política energética e de um modelo de desenvolvimento?

CB: Todas essas alternativas não substituem as grandes usinas hidrelétricas produtoras de grandes blocos de energia, como Belo Monte. Uma energia que, no entanto, é voltada a satisfazer as necessidades e requerimentos do processo eletro-intensivo.

As formas alternativas de energia têm como foco principal trazer benefícios não concentrados em um ou outro setor da economia, e com isso há a necessidade de discutir o modelo de acumulação que vigora em nosso país.

O modelo de desenvolvimento no qual estamos hoje assentados, de meros produtores de bens primários de alto conteúdo energético e baixo valor agregado, não representa um Brasil forte em termos de produção, geração de renda e geração de energia. Pelo contrário, esse modo de apropriação dos recursos naturais em favor de poucos apenas representa e indica que o governo Lula-Sarney faz essa construção em subordinação aos interesses financeiros internacionais.

Trata-se de uma visão equivocada, de que a disponibilidade energética conduz necessariamente ao desenvolvimento. As conseqüências inelutáveis serão a degradação ambiental e o acirramento da crise social.

CC: É possível projetar o tamanho do custo ambiental da obra? Seria digno de contestação não apenas nacional, como também internacional?

CB: Embora tenha sido propagandeado que era da ordem de 1,5 bilhão de reais, o custo ambiental não teve uma contabilidade de fato, não foram citados os parâmetros para se chegar a tal resultado...

A discussão histórica é de que os empreendedores que vão tocar a obra vão buscar reduzir custos. E a procura por redução de custos se dará principalmente sobre as dimensões sociais e ambientais.

Mesmo que tais valores projetados se confirmem, só serão verificados no futuro.

CC: E quanto ao custo social, considerando todo o deslocamento das populações tradicionais, indígenas e ribeirinhas, qual a sua avaliação? Será tão desastroso como no caso de Tucuruí?

CB: O problema é que não se trata, como se pensa, de dar a essas populações opções de uma casinha ou algo assim. O que acontece historicamente é que cerca de 80% das populações atingidas por obras hidrelétricas do país não receberam nenhum tipo de indenização.

Vamos imaginar que o empreendimento consiga fazer alguma forma de ressarcimento à população. O problema reside em que o levantamento do EIA – Estudo de Impacto Ambiental - subestima a população, o que já mostra o problema de se levar em conta o custo real do deslocamento dessa população a partir de uma obra desse porte, ainda mais na região amazônica. É o mesmo que se viu em Tucuruí e se vê agora em Porto Velho (por conta das usinas do Rio Madeira), casos em que o contingente de pessoas atraídas pela busca de emprego não será absorvido, pois a obra fica preferencialmente com a mão-de-obra qualificada. E essa população é mão-de-obra desqualificada, que não dispõe de programas de qualificação previstos nos projetos.

A questão social, acrescentada ao fato de que a população atraída vai demandar equipamentos sociais, moradia, educação, não está contemplada no investimento, não está valorada, e irá se constituir numa conta não assumida pelo empreendedor.

CC: Acredita que toda a contenda em torno da construção, ou não, da usina pode ensejar novas lutas por direitos de povos indígenas, tradicionais e locais, enfim, minorias que habitam terras muito cobiçadas em nosso país por suas riquezas naturais?

CB: A perspectiva de ampliação do processo político de contestação certamente existe. O problema é saber as conseqüências que irá trazer. A depender destas conseqüências, vai ser redefinida a forma como os interesses das populações são, ou não, incorporados ao processo de discussão e de investimentos.

Em minha opinião, a natureza de tais empreendimentos, com sua subordinação aos interesses do capital internacional, determina que esta é uma luta inglória, isto é, existe uma insatisfação popular muito grande, mas que, a meu ver, não abrirá espaço para que populações tradicionais interfiram nas decisões.

Quero dizer que não há compatibilidade entre o exercício democrático e a concepção desses empreendimentos. Eles são excludentes.

CC: Qual será, de todo modo, o final dessa contenda a seu ver? A luta de ambientalistas e populações atingidas conseguirá barrar a obra? Ou, por outro lado, o governo pode acabar engavetando ou adiando o projeto em vista de todo o desgaste gerado pela construção da usina, o qual pode ser utilizado inclusive eleitoralmente pela oposição?

CB: O problema é que, nas atuais circunstâncias, o governo conta com a irreversibilidade do processo. Eu esperava que a lógica prevalecesse, e foi o que aconteceu. Dessa forma, não posso levar em consideração a incerteza do que pode acontecer.

Vai existir incerteza tanto em relação ao empreendimento como no que se refere à contestação política ao resultado do leilão. Isso vai trazer um desgaste muito grande à candidatura do governo, mas tais possibilidades não nos permitem apontar de forma conclusiva o desfecho. Porém, qualquer que seja, o desgaste é enorme e pode representar a fragilização da candidatura Dilma.


*Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.


(Envolverde/Correio da Cidadania)

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Dia da Terra comemora 40 anos em meio a conflitos entre ONGs e governos



redação UrbanPost
de São Paulo

http://verde.br.msn.com/artigo.aspx?cp-documentid=23955949

Em meio a reflexões sobre o futuro do planeta, sob a pressão de organismos mundiais de proteção ao meio ambiente e a resistência de algumas nações para tomar medidas que resultem em práticas de desenvolvimento sustentável, o “Dia da Terra” celebra 40 anos de existência no dia 22 de abril.

Para comemorar a data, o site oficial do movimento convida internautas do mundo todo para registrar em suas páginas as ações -desde plantar uma árvore até liderar manifestações. Até o dia 20 de abril, o site contava com 289 atos catalogados e mais de 700 mil pessoas envolvidas.

Outra ação do movimento é o “Call for a Climate”, algo como “Chamada pelo Clima”. A intenção é chamar a atenção dos governantes fazendo uma ligação telefônica para governantes – prefeitos, deputados, vereadores – no dia da Terra.

Como surgiu o Dia da Terra

O Dia da Terra foi criado pelo senador americano Gaylord Nelson. Em 22 de abrl de 1970, o político convocou o que foi considerado o primeiro protesto contra a poluição. De acordo com dados divulgados na época, mais de 20 milhões de pessoas participaram do ato em todos os EUA.

Hoje, o Dia da Terra é celebrado em mais de 190 países, com a participação de cerca de 1 bilhão de pessoas.

No Brasil

Não há, no país, organismos que reúnam formalmente as atividades para o Dia da Terra. Entre as ações isoladas para a data destaca-se o lançamento da Carta da Terra, da ONG Carta da Terra Brasil. A entidade elaborou uma carta em que defende o respeito à comunidade da vida; a integridade ecológica; justiça social e econômica; democracia e paz. A íntegra da carta pode ser acessada aqui e pode ser distribuída em ferramentas de redes sociais.

A Carta da Terra Brasil também lança a campanha “Começa com você” que incentiva atitudes de defesa ao meio ambiente.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Hidrelétrica no Xingu: o trem fantasma e o chabu



20/04/2010 - 08h04
Por Oswaldo Sevá (*)

O projeto da mega-usina hidrelétrica é bem chamado de Belo Monstro pela garotada de Altamira, pelos ribeirinhos índios e não índios do Xingu paraense e por alguns de nós adultos brancos ainda combatentes da ditadura e da destruição movida pelo capital.

Vai se confirmando o que eu escrevo há anos: mentira em cima de mentira, um dia pode desabar.

O propagandista nazista Goebbels dizia que a mentira sempre repetida torna-se verdade. Mas nem sempre ele acerta.

Quarta feira, dia 14 de abril, começou a circular a notícia de que, mais uma vez, o juiz federal de Altamira, no Pará, Antonio Carlos Campelo, havia acolhido a liminar de uma Ação Civil Pública movida por procuradores federais e determinado a suspensão da Licença Prévia ambiental do projeto Belo Monte, que havia sido concedida pelo IBAMA em fevereiro, e o cancelamento do leilão da eletricidade futura da hipotética usina, marcado para terça-feira, dia 20 de abril, pela Aneel - sim, aquela que merece o nome de Agência dos Negócios da Energia Elétrica.

Segundo o site da UOL na mesma data, "além de suspender a licença prévia e cancelar o leilão, o juiz ordenou que o Ibama se abstenha de emitir nova licença, que a Aneel se abstenha de fazer novo edital e que sejam notificados o BNDES e as empresas Norberto Odebrecht, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Vale do Rio Doce, J. Malucelli Seguradora, Fator Seguradora e a UBF Seguros. A notificação, diz o juiz, é ‘para que tomem ciência de que, enquanto não for julgado o mérito da presente demanda, poderão responder por crime ambiental’. As empresas também ficam sujeitas à mesma multa arbitrada contra a Aneel e o Ibama em caso de descumprimento da decisão: R$ 1 milhão, a ser revertido para os povos indígenas afetados."

A reversão dessa decisão judicial pelos advogados do executivo barrageiro lulista-sarneysista a serviço do capital hidrelétrico transnacional seria apenas uma questão de dias.

Como num verdadeiro trem-fantasma de parque de diversão, a cada curva uma surpresa. Nem sempre as informações usadas por um foram percebidas ou utilizadas pelos outros. É o caso da matéria do grande jornalista paraense Lúcio Flavio Pinto, intitulada "Belo Monte: lago cresceu", publicada em seu Jornal Pessoal no. 462 da primeira quinzena de abril: "No EIA-RIMA, a área do reservatório sofre uma ligeira correção para 515 km quadrados. Mas, no edital de licitação da obra, houve um reajuste ainda mais acentuado, para 668 km². A evolução, a parir da primeira versão do novo projeto, já passou de 50%. Embora em valores absolutos a diferença não seja tão expressiva, o percentual é alto demais para que a dança de números transcorra sem explicações. E até mesmo sem cobranças, já que os opositores do projeto não parecem ter observado a mutação".

Meu recado para quem anda articulando mais uma Ação Civil Pública, a qual corre o risco de, como as demais, apenas ‘fazer as coisas menos mal feitas’, eis um bom motivo para enquadrar o crime de falsidade ideológica, já que a Licença Prévia diz um número e o edital diz outro, e ambos foram paridos pelo mesmo poder. A não ser que se decida que a Agência de Negócios Elétricos não faz parte de nenhum poder...

Bem, do jeito que vai, acabará sendo como a obra de Jirau no rio Madeira, onde, depois de obtidas a Licença Prévia e a Licença de Instalação, as transnacionais barrageiras mudaram o eixo de barramento quase dez quilômetros rio abaixo, o que provocará o alagamento de terras e a expulsão de moradores nunca previstos nem estudados no EIA.

Ou então... Vai dar chabu! Salvo engano excepcional, do qual me redimirei se preciso, as pistas que levam ao chabu geral são:

1. O investimento seria da ordem de 30 bilhões de reais, mas o governo insiste com valores de 18, 19, 22 bilhões, nessa faixa. Ninguém sabe de fato o custo dos canais imensos concretados, 500 metros de largura, 20 metros de profundidade, nem das dezenas de diques laterais que formariam as cinco represinhas dos igarapés afluentes da margem esquerda do Xingu no interior da Volta Grande.

A colunista Miriam Leitão repercutiu isso no dia 10, logo após a desistência das duas maiores empreiteiras em participar do leilão: "Sobre Belo Monte, recaem muitas dúvidas. De toda ordem: financeira, ambiental, de engenharia. Isso é que está assustando investidores. ‘Há um canal gigantesco que precisa ser feito, cujo estudo nunca foi feito adequadamente. Não se sabe se esse terreno é 90% pedra e 10% terra, ou o contrário. O custo do canal vai depender da natureza desse terreno’, diz Mario Veiga, presidente da PSR".

2. O maior roubo já articulado pelos honoráveis bandidos: seja o que for, nenhum grande banco privado quis entrar, o governo obriga o BNDES a bancar sem os técnicos do banco terem analisado detalhadamente se dá ou não retorno, o governo pressiona agora a Petros, o Funcef e a Previ – fundos de pensão dos petroleiros e dos bancários, há anos sendo dirigidos pela aristocracia cutista, para colocarem a grana, ou melhor, a pensão futura dos trabalhadores e de suas viúvas, sem o devido respaldo de análise de retorno. Enquanto isso, quase todas as grandes empresas seguradoras ficam só olhando e as concorrentes do leilão exigem que o Tesouro Nacional securitize o risco... Nem Al Capone faria tão bem.

Quando até a Miriam Leitão publica no Globo.com artigo intitulado "Na lei ou na marra" é porque o Belo Monstro também virou pauta da imprensa golpista, ou, se quiserem, da campanha serrista. Segundo ela: "Em Belo Monte, prepara-se para fazer concessões maiores para atrair investidores a qualquer preço e iniciar a obra em qualquer contexto jurídico, passando por cima de quaisquer dúvidas ambientais. Isso porque, como disse o presidente: ‘Belo Monte será construída’. Talvez seja mesmo, mas antes será preciso cumprir a lei. Na marra, não será possível".

3. O risco geotécnico. Esse é o grande segredo que em 2009 alguns deixaram escapar e que agora parece ter motivado de fato a desistência da Odebrecht e da Camargo Correa, que soa incompreensível sob qualquer outro angulo. A Camargo, com o seu escritório CNEC, está insuflando os projetos no Xingu desde a década de 1970, quando, entre otras cositas, contribuía para a repressão sobre os opositores da ditadura. Mas é o corpo técnico que melhor conhece o projeto e os locais onde seria construído.

Se o risco geotécnico for o motivo, há razões: o piso da Volta Grande é a transição entre o terreno cristalino do planalto central e o terreno aluvionar da planície amazônica, tem trechos de terreno cáustico (com carbonatos de cálcio, frágil, furado, cavernoso), as lajes por onde o riozão se espalha, e às vezes mergulha por debaixo, mostram fraturas rochosas longas, profundas, em forma de mosaico, que são visíveis na morfologia da Volta Grande e talvez sejam bem mais graves por baixo da camada visível.

4. E claro, lá estão de olho os Kaiapó, alguns milhares, que sobreviveram aos massacres seculares, vieram vindo desde o Triângulo Mineiro e o sul de Goiás para o Mato Grosso e o sul do Pará, não tendo agora mais para onde ir. Conhecem os brancos melhor do que nós mesmos, e vão guerrear até morrer.

5. "Last but not least", estão no ar as campanhas do James ‘Avatar’ Cameron, do cantor Sting e de várias Ongs barulhentas, incluindo os aliados do bispo de Altamira, dom Erwin Krautler, e parte da sua igreja aqui e na Europa. Esse pessoal já monitora os fatos e estrila como nunca dantes ocorreu.

Os demais argumentos dissidentes (pouca energia do rio para tanta potência instalada, mais de vinte mil atingidos sem reassentamento, graves perdas ambientais, audiências públicas manipuladas e sob repressão fardada...) são justos e importantes, mas não o suficiente para fazer o projeto naufragar. Fica a incógnita se a candidatura Dilma naufraga junto ou não.

Por enquanto, a aliança petista-sarneysista, da qual Belo Monstro virou emblema, está somente fazendo água, levando susto a cada curva.

Oswaldo Sevá é professor da Universidade Estadual de Campinas, engenheiro, doutor em Geografia Humana pela Universidade de Paris-I, colaborador dos ameaçados e dos atingidos pelas barragens, estudioso de hidrelétricas há 35 anos e do projeto Belo Monte há 22 anos.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Leilão de usina de Belo Monte volta a ser suspenso

Ainda não dá para cantar vitória mas o movimento está forte. Quem quiser ler a liminar acesse o link e baixe a decisão judicial:

http://www.pa.trf1.gov.br/noticias/docs/Belo%20Monte%20-%20legisla%C3%A7%C3%A3o%20ambiental%20-%20infra%C3%A7%C3%B5es%20-%20liminar.doc

19/04/2010 - 17h14
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
da Agência Folha, em Belém
Atualizado às 18h03.



A Justiça Federal em Altamira (PA) voltou a suspender, nesta tarde, o leilão da hidrelétrica de Belo Monte, a ser construída no rio Xingu, no Pará. A decisão do juiz Antonio Carlos Almeida Campelo é liminar, ou seja, emergencial, e atendeu pedido do Ministério Público Federal. Ele também mandou cancelar a licença prévia da obra.




Com isso, a realização do leilão da usina, até agora previsto pelo governo federal para amanhã, está de novo ameaçada.


A AGU (Advocacia Geral da União) afirmou que o recurso já está sendo escrito, e que ele será protocolado ainda hoje no TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, em Brasília.
Na semana passada, o mesmo Campelo já havia dado uma decisão idêntica. Aquela liminar analisava questões estritamente jurídicas, e acabou cassada rapidamente em decisão do presidente do TRF, Jirair Meguerian.
A de hoje é mais extensa do que a anterior, e está recheada de decisões e leis de outros países, como EUA e Austrália.
Ela elenca diversas supostas ilegalidades nos trâmites legais e enumera possíveis inconsistências dos estudos que levaram o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) a aprovar Belo Monte.
Primeiro, Campelo diz que as audiências públicas sobre o projeto foram "meras encenações" e que a falta de dados sobre o projeto fere o princípio jurídico da precaução.
O magistrado cita um parecer do Ibama, assinado no mesmo dia em que a autorização de licença, no qual é dito que "não há elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do empreendimento, até que sejam equacionadas as pendências apontadas".
E pergunta: "Como, no mesmo dia, dois documentos são emitidos com informação totalmente contraditória em um empreendimento de grande vulto e complexidade como [...] Belo Monte?"
Ele critica a potencial extinção de espécies de peixes e os danos causados aos moradores da chamada Volta Grande do Xingu, trecho em que possivelmente o rio secará, devido à tecnologia inédita que será usada na hidrelétrica.
Campelo também diz que é ilegal o leilão ter sido marcado sem a que a obra tenha licença de instalação --passo imediatamente posterior à licença prévia, dentro do rito legal de licenciamento ambiental. Segundo ele, isso contradiz frontalmente uma resolução do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente).
A decisão de hoje só ocorreu pois o MPF dividiu em duas a ação em que, originalmente, tentaria brecar a usina. A ideia dos procuradores da República foi acelerar a apreciação de seus pedidos.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u723007.shtml

Nutricionista guarda Mc Lanche Feliz por um ano; veja o poder dos conservantes

Essa reportagem publicada no final de março deste ano pelo jornal britânico Daily Mail é muito intrigante. Leiam e tirem suas próprias conclusões.






Uma reportagem publicada no final de março deste ano pelo jornal britânico Daily Mail deixou seus leitores de boca aberta. Uma nutricionista americana resolveu fazer um teste para constatar se a comida do McDonald's possui conservantes em excesso. O resultado foi assustador.

Durante um ano, Joann Bruso guardou um "Mc Lanche Feliz", um kit composto por sanduíche, refrigerante e batata frita, que acompanham um brinquedo e é vendido para as crianças. "A comida normal tem que se decompor, cheirar mal... Entretanto, o lanche e as batatas não estragaram e isso mostra que as crianças não estão comendo de forma saudável", declarou.

De acordo com a reportagem, Joann deixou o lanche e as batatas descobertos, em cima de uma prateleira em sua casa, no estado americano de Colorado, para checar o que aconteceria. Durante um ano, nenhuma mosca sequer chegou perto do sanduíche. "Eu deixava a janela aberta mas as moscas e outros insetos simplesmente ignoravam o 'Mc Lanche Feliz'".

"A comida é decomposta dentro do nosso organismo, que se aproveita dos nutrientes dela para transformá-los em combustível", explica Joann. "Nossas crianças crescem de forma saudável quando comem comida de verdade".

A nutricionista ainda explica que se o "Mc Lanche Feliz" foi ignorado por bactérias e micróbios que não fizeram a decomposição, isso significa que o corpo da criança também não consegue digerir esse tipo de comida de forma adequada.

Segundo dados apresentados pelo Daily Mail, pesquisas recentes afirmam que o pão da McDonald's possui uma série de conservantes como propionato de sódio. Já o pickles utilizado pela rede de fast-food leva benzoato de sódio.

As batatas fritas, que Joann descreveu como estando "douradas mesmo um ano depois", contém conservantes como ácido cítrico e pirofosfato de ácido de sódio, que mantém sua coloração.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

MÍRIAM LEITÃO Sobre Belo Monte

O Globo - 14/04/2010

Por 100 quilômetros o rio Xingu vai passar a ter uma vazão mínima de água, e, às margens dessa área, há tribos, ribeirinhos, floresta. Os técnicos do Ibama escreveram que não garantiam a viabilidade ambiental da hidrelétrica de Belo Monte.

Duas das maiores empreiteiras do país desistiram porque acham arriscado demais economicamente.

Mas o governo diz que fará o leilão.

Há dúvidas de todos os tipos sobre a hidrelétrica: ambiental, econômico-financeira e política. Por que ignorar tantas dúvidas? Por que leiloar a mais polêmica das hidrelétricas brasileiras a seis meses das eleições com um só grupo interessado? Por que tentar forçar a formação improvisada de um novo grupo, manipulando os fundos de pensão? A primeira vez que se pensou em fazer essa hidrelétrica foi no auge do poder do governo militar, em 1975. Nem eles, com AI-5, sem audiências públicas, com um estado maior e mais insensato; nem eles, que fizeram Balbina, tiveram coragem de levar adiante o projeto.

O Ministério Público levanta dúvidas sobre várias questões, mas principalmente não entende a pressa do governo: — Os técnicos do Ibama escreveram que não tiveram tempo de considerar as questões levantadas nas audiências públicas, escreveram que não tinham como garantir a segurança ambiental do empreendimento, há dúvidas sobre a viabilidade econômicofinanceira e mesmo assim o governo diz que fará a obra — diz o procurador da República Bruno Alexandre Gutschow, do Pará.

Há vários outros pontos que estão sendo analisados pelo Ministério Público e novas ações podem ser propostas nas próximas horas.

Eles entraram com duas ações pedindo a suspensão do leilão. E a vice-procuradorageral da República, Débora Duprat, enviou um ofício ao presidente do BNDES exigindo respostas para várias perguntas: se o banco fez estudo da viabilidade econômico-financeira do projeto; quanto pretende financiar; se pesou o custo sócio-ambiental de deslocar 50 mil pessoas.

No mês passado, o Ministério Público tinha feito essas perguntas ao BNDES, e ele admitiu que desconhece os detalhes do empreendimento.

Estranhíssimo. Ele será o grande financiador, como pode desconhecer? O governo claramente está forçando a barra diante de todas as dúvidas. Ontem, a Aneel adiou o prazo de inscrição para participar do leilão.

E, sem qualquer transparência, o governo tenta montar um novo consórcio.

O Ministério Público se perguntou numa das ações propostas: como manter a biodiversidade da área impactada pela redução da vazão de água? Como manter a segurança alimentar da população da área? Como garantir a navegabilidade do rio? Dúvidas que ficaram sem respostas porque os técnicos do Ibama disseram várias vezes em seus pareceres e de forma contundente o seguinte: "A equipe mantém o entendimento de que não há elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do empreendimento." O pesquisador Francisco Hernandez, da USP, que estudou Belo Monte, define como um "monumento fluvial" o Rio Xingu, pela sua exuberante biodiversidade.

O procurador Gutschow diz que há mais espécies de peixes lá do que em toda a Europa.

Mas alguém pode considerar que tudo isso deve ser sacrificado por uma hidrelétrica que será a terceira do mundo e que vai produzir 11 mil MW. Isso é um enorme engano. A produção média mal passará de 4 mil MW, e por três ou quatro meses no ano pode ser de meros 1 mil MW pelo regime das águas do rio.

Alguém pode argumentar que a hídrica é uma energia barata. É mesmo? A obra está calculada em R$ 19 bilhões, mas o que as empreiteiras estão dizendo é que talvez chegue a R$ 30 bi. Essa incerteza é que afasta muitos competidores. Além disso, há o custo não contado dos enormes linhões atravessando a floresta e muito distantes dos centros consumidores.

Pode-se argumentar também que se não forem feitas as hidrelétricas da Amazônia, restará ao Brasil a energia fóssil vinda do carvão, ou petróleo. É mesmo? Há inúmeras outras alternativas num país como o Brasil: biomassa, eólica, solar, eficiência energética, pequenas usinas, marés. A Coppe tem protótipo de usinas de marés, há estudos mostrando que se deveria estimular a autogeração renovável de fontes alternativas pelas indústrias.

Se você concorda com a ex-ministra Dilma, para quem nenhuma dessas fontes pode ser levada a sério, em grande escala, veja os números da Europa: A Alemanha no final de 2009 tinha 25.800 MW de energia eólica; a Espanha, 19.150 MW. Em toda União Europeia, 75 mil MW. Na Dinamarca, representa 20% da energia; em Portugal, 15%. Os Estados Unidos têm 35 mil MW. Isso sem falar do enorme potencial fotovoltaico (solar) do Brasil.

O Brasil explorou intensamente seu potencial hídrico, agora ele está em local distante, de grande impacto ambiental, com custos de construção e manutenção mais altos e incertos. A tendência agora é descentralizar a geração, e produzir barragens menores que reduzam o estrago ao meio ambiente.

Enfim, quem pensa que só existe barragem ou fóssil precisa urgentemente atualizar seus conceitos.

O jogo de cartas de Belo Monte




Por Efraim Neto, do Mercado Ético
19/04/2010

De história antiga e localizada em uma das regiões de maior diversidade biológica e cultural do país, a região conhecida como Volta Grande do Xingu, UHE de Belo Monte é alvo de um jogo de cartas que parece não ter fim.

Para algumas organizações socioambientais o maior projeto do Pacote de Aceleração do Crescimento (PAC) e grande alvo do palco político das eleições de 2010, a construção da Hidrelétrica de Belo Monte é uma resposta medíocre para o desafio de gerar energia para o país. Como assinala Washington Novaes, em artigo de 2001 no Estadão, a história da obra é antiga e até precisou mudar de nome; chamava-se Kararaô, na tentativa de vencer a polêmica que provocou ainda na década de 1980, quando foi anunciada. Na época um estudo coordenado pela Comissão Pró-Índio apontou que a bacia do Xingu sofrerá modificações ecologia, demográficas e econômicas que estão sendo subestimadas, ignoradas e ocultadas. O que podemos concluir das discussões de hoje: a história se repete!

Com leilão marcado para o próximo dia 20, a obra parece ser a menina dos olhos da Dilma Rousseff, a mãe do PAC. Belo Monte é uma usina hidrelétrica projetada para ser construída no Rio Xingu, no Pará, com potência instalada de 11.233MW. O lago da usina terá 516 km2 e será, segundo informa o governo, a única usina hidrelétrica no Rio Xingu. A sua construção está avaliada em 16 bilhões, segundo o governo; e 22 a 30 bilhões segundo as empresas. O leilão para a definição do construtor da UHE de Belo Monte estava previsto para ocorrer em 21 de dezembro do ano passado, mas foi remarcada para o dia 20 de abril de 2010, próxima terça-feira. É neste momento que o jogo de cartas chega a um dos pontos mais críticos deste debate; quando são discutidos valores, ações, impactos e interesses.

Valores

Segundo alguns especialistas em energia, diferente das usinas Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, a quantidade de energia que será produzida em Belo Monte é muito inferior. Com a capacidade instalada de 11.233MW, a usina terá apenas 4.462MW médios de energia assegurada, ou seja, 39% do potencial máximo. Em Jirau, essa relação é de 59,8%; em Santo Antônio, de 70,4%. A vazão do rio Xingu na cheia é de 23 mil m3/s, correspondendo a 4 vezes mais do que a vazão das Cataratas do Iguaçu na cheia.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal que planeja o setor diz que é possível erguer a terceira maior usina em potência do mundo, e determinou a sua tarifa-teto em R$ 68 por megawatt/hora, recentemente aumentada para R$ 83, pelo Tribunal de Contas da União. As empresas desejam R$ 140 por megawatt/hora. Recentemente a ex-ministra-chefe da Casa Civil da Presidência da República, Dilma Rousseff, afirmou que a participação da Eletrobrás no leilão da usina de Belo Monte tende a ser de 49% no valor total da operação. O BNDES pode vir a financiar até 80% do valor total do projeto e já possui autorização para liberar até R$ 13 bilhões de forma direta, pelas regras que limitam a utilização de até 25% do patrimônio de referência.

O Custo Direto Total (CDT) de Belo Monte já chegou até a ser modificado. Isso tudo nas últimas semanas que antecedem o leilão. Após revisão da EPE, foi aprovada pelo TCU que o canteiro de obras seja mais de quatro vezes o valor inicial, passando de R$ 640 milhões para R$ 2,85 bilhões. Antes da revisão os custos indiretos representavam 10,8% do CDT. Com a revisão, esta porcentagem passou para 22,7%.

Política

A política é o momento do jogo mais perigoso e mais desafiador. É neste momento em que vemos o quão o governo e as empresas utilizam seus contatos e influências em benefício próprio e de uma minoria, obviamente para a manutenção de suas esferas de domínio e ação. Para a construção de Belo Monte, a estratégia seria juntar 12 empresas inscritas na chamada pública da Eletrobras em consórcios capitaneados cada um por uma subsidiária da empresa (Furnas, Chesf, Eletronorte e Eletrosul). Entretanto, dessas 12 empresas habilitadas, poucas têm condições concretas de formar um consórcio competitivo. E para complementar o tempero da jogatina, desistiram de se associar às Centrais Elétricas Brasileiras S.A e também de participar do leilão, a Camargo Corrêa e Odebracht, a CPFL (controlada pela Camargo Corrêa) e a Suez. O então presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, andou dizendo na imprensa que a própria participação da Camargo Corrêa e Odebrecht no leilão ainda não é uma carta fora do baralho. A pergunta que nos resta é: O que o governo esconde em suas mangas?

No primeiro dia de fevereiro deste ano, o IBAMA concedeu a licença prévia para a construção da usina. E desde então foi possível perceber um “oba oba” governamental sobre os esforços do órgão e papel do ex-ministro do meio ambiente, Carlos Minc, em conseguir a licença. Este ato se tornou muito visível quando no último dia 31 de março, o presidente Lula elogiou o ex-ministro, em sua despedida do ministério, sobre os seus esforços.

Pouco dias depois da divulgação da licença prévia, o Ministério Público Federal, através de uma ação civil púbica entra com processo contra o leilão de Belo Monte. O MPF argumentou que houve desrespeito à Constituição Federal e à Legislação Ambiental, com falhas na elaboração dos estudos de viabilidade ambiental da obra, principalmente em relação aos impactos sobre a qualidade da água e a manutenção da biodiversidade e das populações ribeirinhas e indígenas. A sua aprovação, na última quarta-feira, 14, ordenou que o IBAMA se abstenha de emitir nova licença, que a Aneel se abstenha de fazer novo edital e que sejam notificados o BNDES e as empresas que possuem interesse em participar do leilão. A multa para o descumprimento da determinação judicial será de R$ 1 milhão. Essa foi um joga forte contra o governo, mas já derrubada pela Advocacia Geral da União (AGU).

Poucos dias após essas movimentações, a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, solicitou, pela segunda vez, ao presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que informasse num prazo de dez dias qual o volume de recursos que o banco dispõe para financiar os empreendimentos do setor elétrico, em especial Belo Monte. Em sua reposta, o BNDES informa que “desconhece os detalhes do empreendimento do projeto da UHE Belo Monte, fato esse que somente ocorre após a apresentação do pedido de financiamento da eventual beneficiária que resultará do leilão a ser promovido pelo poder concedente”.

É interessante ressaltar que a AGU ameaçou processar os procuradores federais do Pará que questionaram a licença na Justiça. Acrescido a isso no dia 16, a limitar foi derrubada e a Aneel anunciou que está mantido o leilão para a próxima terça-feira, dia 20. Isso ocorreu após a Aneel anuncia o cancelamento do leilão. Essa é a grande prova de que a Presidência necessita fazer sua propaganda, qualificar o PAC e anunciar que deixou um forte plano energético para que país não passe por outro apagão como ocorreu no governo FHC. Chamemos isso de joga baixa.

Ainda faz parte desta obscura jogada as propostas feitas pelo setor privado, que colocou na mesa sugestões para compensação, entre as quais: um Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi), maior do que o já ofertado; em cronograma para a geração mais alongada do que previsto hoje; e limites para os riscos ambientais geológicos assumidos pelas empresas. Entretanto, nada muito específico ou com número e prazos fixados.

Segundo informou o Governo, a distribuição de energia de Belo Monte será da seguinte maneira: 70% irá para o mercado das distribuidoras; 20%, para os grandes consumidores de energia; e 10% poderão ser negociados com os chamados consumidores leves.

Para finalizar esse item, aponto que a Funai, ainda no ano passado, concedeu autorização para a construção da UHE de Belo Monte sem consultar as mais de 28 etnias indígenas que vivem na região, demonstrando interferência política no processo técnico de avaliação dos impactos.

Impactos

O local de construção da UHE Belo Monte é constituído por 51.600 hectares de florestas, com um espelho d’água de 516 km2. A concepção dessa obra da engenharia civil proporcionará o desvio do rio com a construção de dois canais de 500 m de largura e 30 km de comprimento, deixando 100 km de leito seco, submergindo a Volta Grande do Xingu e um terço do município de Altamira. Acrescido a isso, e por mais que o governo prometa que seja apenas a única hidrelétrica no rio (e há em nossa política a mania de prometer e não cumprir), para que Belo Monte apresente um grau de eficiência energética compatível com as recomendações técnicas, seria necessária a construção de outras três hidrelétricas na bacia do Xingu, que teriam que regular a vazão do rio. Apenas por ora a construção dessas usinas foi descartada pelo governo porque estão projetadas para o coração da bacia, onde 40% das terras pertencem aos indígenas.

Até o início do funcionamento das primeiras bobinas, em 2015, está previsto um fluxo de 100 mil pessoas para a região da Volta Grande do Xingu. Uma ação que por si só já gerará prejuízos socioambientais sem precedentes. Para a construção da UHE Belo Monte serão retirados 210 milhões de m2 de pedra e terra, o que corresponde a um volume maior do a do Canal do Panamá. Também serão desmatados 50 mil hectares em zona de mata em pleno coração da Amazônia. Infelizmente a licença prévia permite a realização do leilão de Belo Monte, ainda sem que importantes impactos tenham sido identificados. Para mitigar os efeitos ambientais da construção da obra, o IBAMA apontou 40 condicionantes para aliviarem os imensos impactos socioambientais de Belo Monte. Vale lembrar que na Transposição do São Francisco o órgão apontou 30 condicionantes; nenhuma foi cumprida.

Para finalizar, segundo o Instituto Socioambiental, o Parecer Técnico nº 114/2009, de 23 de novembro de 2009, que não está disponível no site do IBAMA, expõe que “tendo em vista o prazo estipulado pela Presidência, esta equipe não concluiu sua análise a contento. Algumas questões não puderam ser analisadas na profundidade apropriada, dentre elas as questões indígenas e as contribuições das audiências públicas. Além disso, a discussão interdisciplinar entre os componentes desta equipe ficou prejudicada. Essas lacunas refletem-se em limitações neste Parecer”.

O que nos resta agora é aguardar o leilão e o final dessa jogatina; e torcer para que os impactos socioambientais sejam os menores possíveis. Porque não são mais inevitáveis. Infelizmente neste jogo de cartas sempre ganha quem esconde cartas nas magas. Mas quem perde é a sociedade; a logo prazo.

Belo Monte: ora, as leis

Carta Movimento

Filme – Povos do Xingu


(Envolverde/Mercado Ético)

Entidades pedem suspensão do leilão de Belo Monte, alegando vício do edital

19/04/2010
Local: São Paulo - SP
Fonte: Amazonia.org.br


A ONG Amigos da Terra-Amazônia Brasileira, a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) propuseram hoje (19) uma ação civil pública à Justiça Federal de Altamira, pedindo a suspensão do leilão da usina hidrelétrica de Belo Monte- a ser construída no rio Xingu (PA)-, com realização prevista para amanhã (20).

A ação, contra a União, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a Eletrobrás, e a Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE), tem como argumento o fato de o edital da disputa por Belo Monte indicar que a área dos reservatórios da usina seria de 668,10Km2, quando o Estudo/Relatório de Impactos Ambientais (EIA/RIMA) da obra, com base no qual foi dada licença prévia ao empreendimento, indica que a área total dos reservatórios será de 516 km2.

"Essa alteração do projeto, feita de forma extemporânea e admitida pelo edital do Leilão 06/2009, demanda novos estudos de impacto ambiental e a realização de novas audiências públicas, porquanto aquelas que foram realizadas levaram em conta apenas a área total de 516 km2", diz trecho do pedido inicial da ação.

Segundo as entidades que pedem a suspensão do leilão, também o "Estudo para Licitação da Expansão da Geração" de Belo Monte, que foi produzido pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e pela EPE e está anexado ao edital da disputa, considera o reservatório com área total de 516 km2 para a potência instalada de 11.233 MW.

Porém, imagens de satélite de um dos anexos do edital do leilão apontam a área dos reservatórios como sendo de 668,10 km2.

"Considere-se que a diferença entre a área total estudada e autorizada pela licença ambiental prévia e a área total que compõe o edital do Leilão da Usina de Belo Monte não decorre de uma variação aceitável ou ínfima, mas sim um aumento de mais de 29,47%. Ou seja, essa diferença representa um aumento de aproximadamente um terço da área dos reservatórios estudada e autorizada pelo Órgão Ambiental Competente", argumenta o pedido.

Os autores da ação também alegam que, diante da contradição entre os documentos que compõem o edital de Belo Monte, o objeto da licitação é indefinido e, portanto, viola a Lei de Licitações, segundo a qual a má-caracterização do objeto impede a realização do leilão.

Obras do PAC foram responsáveis por 730 km2 de desmatamento em três biomas

19/04/2010
Local: São Paulo - SP
Fonte: Amazonia.org.br


O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já desmatou - de forma legal - 730 km2 de florestas do Brasil, nos biomas Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. A área desmatada equivale à metade do município de São Paulo. A informação é do jornal Folha de S. Paulo.

O PAC foi criado em 2007 e, desde então, já obteve 155 autorizações expedidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para desmatar. O programa abrange obras de recursos hídricos, usinas hidrelétricas, ferrovias e rodovias, entre outros empreendimentos.

Cada uma dessas autorizações para desmatamento traz uma série de contrapartidas, entre elas o plantio de uma área equivalente à devastada. Porém, segundo a reportagem da Folha, não existe fiscalização do cumprimento dessas condicionantes.

Infraestrutura As obras de infraestrutura do PAC preocupam especialistas, em especial, rodovias como a BR-319 (Porto Velho - Manaus). Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), 80% do desmatamento na região ocorrem num raio de 50 km das margens das estradas.

Para Adalberto Veríssimo, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o sinal amarelo do desmatamento está ligado. "A história mostra que o desmatamento ocorre na sequência de obras de infraestrutura. Agora, o governo diz que não vai acontecer, mas existe o risco com essas obras do PAC", disse à Folha.

Pesquisadores e ONGs contestam Belo Monte

O documento mais contundente, produzido por 42 pesquisadores de universidades brasileiras e estrangeiras, aponta várias falhas no projeto


Renato Andrade de Brasília - O Estado de S.Paulo
19 de abril de 2010 | 0h 00


O esforço e a pressa do governo em tentar a todo custo garantir a construção da usina de Belo Monte, no rio Xingu (PA), gerou reação contrária de mesma magnitude de organizações sociais, indígenas e especialistas. Os argumentos contra a hidrelétrica vão desde os efeitos ambientais que a obra irá causar até questões técnicas, como a efetiva geração de energia do empreendimento a partir de 2016.

O documento mais contundente contra a construção da usina no Xingu foi produzido por um grupo de 42 pesquisadores de universidades brasileiras e do exterior. Nas 230 páginas, engenheiros elétricos, antropólogos, biólogos e pesquisadores de outras áreas fizeram pareceres apontando falhas de avaliação dos impactos que a usina terá sobre a região e a população local, bem como os problemas técnicos e econômicos da principal obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo Luiz Inácio Lula da Silva.

Francisco Hernández, engenheiro elétrico e doutorando em Energia pela Universidade de São Paulo (USP), argumenta no estudo que a variação no volume de energia a ser produzido pode forçar a construção de outras usinas ao longo do rio Xingu, apesar das negativas oficiais.

Para evitar o alagamento de uma grande região, a usina funcionará de acordo com a vazão do rio Xingu. Isso significa que apesar da capacidade de geração de 11.233 Megawatts (MW), Belo Monte produzirá, em média, 4.500 MW.

Alternativas. O governo afirma que a usina custará R$ 19 bilhões, mas investidores privados calculam que a obra não sairá por menos de R$ 30 bilhões. "O custo de Belo Monte é um fator essencial no realismo, ou na falta de realismo, do cenário oficial de ter apenas uma barragem no rio Xingu", escreveu Philip Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, no parecer. Ele critica o fato da projeção de investimento não incluir o custo das linhas de transmissão e subestações.

Para o advogado Luiz Piauhylino Monteiro Filho, especialista no setor energético, a insistência do governo em construir a hidrelétrica mostra a falta de disposição em avançar na produção de energia por meio de outras fontes. O setor sucroalcooleiro, exemplifica o advogado, deixa de produzir o equivalente a 5.000 MW de energia por ano por falta de investimentos para o aproveitamento do bagaço da cana como matéria-prima.

Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que fará Belo Monte custe o que custar, com ou sem consórcios participando do leilão.

Exportação. Para o professor Carlos Vainer, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano Regional (Ippur) da Universidade Federal do Rio de Janeiro, esse tipo de política "colocou o Brasil num projeto de transformação de seus territórios de fonte de energia barata para o consumo não do nosso povo. Hoje, 25% a 30% da nossa energia é consumida para exportação. Estamos ajudando os japoneses a beber cerveja em latinha de alumínio a preços subsidiados."

A construção de Belo Monte, segundo ele, "estabelece o que será a Amazônia nos próximos anos, (transformando a região) numa fronteira energética que vai produzir energia para exportação, em direção ao Sudeste e em direção ao exterior."

Contaminação por transgênicos põe em risco o meio ambiente e viola o Direito dos Agricultores



Secretaria de Agricultura do Estado do Paraná – SEAB divulgou, no dia 6 de abril, os resultados do “Plano de Monitoramento do fluxo gênico entre lavoura de milho transgênico e não transgênico na região Oeste do Paraná”. O estudo possui rigor científico e comprova a contaminação de lavouras comuns pelo milho transgênico, mesmo dentro das regras estipuladas pela CTNBio. O estudo foi divulgado através de uma Nota Técnica, que reúne metodologia, resultados e conclusões dos dados produzidos durante o monitoramento das lavouras de milho no oeste do estado, durante a safrinha de 2009 (fevereiro a junho).

Os resultados apontaram que, mesmo se o agricultor seguir corretamente as orientações estabelecidas pela Resolução Normativa nº 04 editada pela CTNBio, o percentual de contaminação é muito alto. “Os dados confirmam que a Resolução Normativa nº 04 não é suficiente para assegurar a proteção da integridade do patrimônio genética prevista no Art. 225 da Constituição Federal de 1988”, afirma o documento técnico. Pela norma, o produtor de milho transgênico deve respeitar uma distância de 100 metros ou de 20 metros vazios mais 10 fileiras de milho das lavouras vizinhas.

Os dados revelam que, mesmo considerando-se uma distância maior do que a exigida pela RN 4, a contaminação foi maior do que 1% em todas as faixas de 25, 30, 60, 90 e 120m de distância do cultivo de milho transgênico. A análise do seqüenciamento do DNA aponta o percentual de grãos transgênicos em relação ao número total de grãos por espiga. De acordo com as regras nacionais de rotulagem, uma produção com um índice maior do que este deve ser rotulado como transgênico. Se este milho fosse destinado para mercado orgânico, onde o índice de transgenia deve ser 0%, a produção estaria comprometida, assim como a certificação do produtor. Para o mercado europeu, o produto também seria rechaçado, já que a certificação NON-GMO possui tolerância de 0,9%.

Dados da pesquisa aumentam insegurança quanto aos transgênicos - A pesquisa da Seab utilizou dois testes: o de fita (que detecta a produção da toxina Cry1ab geneticamente modificada na semente) e a análise laboratorial de PCR tempo real (real time polymerase chain reaction). O estudo comprovou a presença de genes transgênicos e a troca de genes entre as plantas em um índice que varia de 0,7% e 4,4% a 90 metros de distância e de até 1,3% a 120 metros de distância da lavoura transgênica. Plantas como o milho trocam pólen entre si, sendo que cada uma pode produzir de 4 a 20 milhões de grãos de pólen. Portanto, tomando-se a estimativa mais conservadora, espera-se 44.000 grãos de pólen de uma planta transgênica a uma distância de 200 m.




Os resultados da pesquisa foram observados com isolamento maior do que estabelecido pela Resolução Normativa n.4, o que leva a concluir que a contaminação acontece em níveis significativos. O estudo comprova também que a contaminação acontece com as lavouras ainda no campo, antes de serem colhidas. Com isso, fica descartada a possibilidade de separar as culturas no restante da cadeia produtiva.

“Estes resultados finais ratificam os dados preliminares apresentados anteriormente pela Seab e que a CTNbio se recusou a considerar. Está claro que a norma vigente desconsidera vários aspectos que influenciam sobremaneira a polinização cruzada, como topografia, ventos, umidade, polinizadores etc”, afirma a assessora jurídica da Terra de Direitos, Larissa Packer. Para ela, considerando os danos irreparáveis ao patrimônio genético e cultural que este equívoco da CTNBio pode causar, o Conselho Nacional de Biossegurança deveria instaurar um Grupo de Trabalho interministerial para “considerar uma norma de coexistência que preveja, de forma global, os demais passos para uma devida segregação da cadeia produtiva do milho. Só assim poderemos dizer que o Brasil realmente cumpre com os critérios de biossegurança, segundo o princípio da precaução”.

Direito dos Agricultores – Além de ferir o direito dos consumidores em saberem se estão ou não consumindo transgênicos, a contaminação genética no campo coloca em risco a existência de determinadas variedades de milho desenvolvidas há centenas anos pelos agricultores brasileiros. A troca de sementes entre agricultores é responsável pela conservação e melhoramento genético das variedades tradicionais e crioulas de milho no país. Por isso, a contaminação genética é vista como um risco irreparável a conservação da diversidade biológica cultivada e silvestre.

Ao longo dos anos, os agricultores e agricultoras vêm identificando, selecionando e melhorando as sementes silvestres, o que garantiu a produção de alimentos de forma mais sistemática e a constituição da agricultura tal qual conhecemos atualmente. “Além disso, este processo permite a conservação dos valores culturais e tradicionais através da conservação e uso de variedades locais e/ou tradicionais. “Dessa forma, têm um inestimável valor para a humanidade, constituindo a base de seu patrimônio genético e cultural, o que garante o direito humano à alimentação adequada dos povos”, afirma a advogada.

Por este motivo, a manutenção das práticas das comunidades agrícolas vem sendo constituída enquanto um direito, em nível internacional e também no Brasil. A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) e o Tratado sobre Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura (TIRFAA) da FAO reconhecem os camponeses e povos indígenas como sujeitos de inovação e melhoramento genético dos recursos biológicos. As técnicas de seleção, uso, manejo dos componentes da diversidade silvestre e a prática de reservar suas sementes para o replantio são reconhecidas internacionalmente como responsáveis pela conservação da diversidade biológica (Convenção sobre diversidade Biológica – CDB) e pela criação ou melhoramento genético da agrobiodiversidade, componente cultivado da diversidade biológica (Tratado sobre os Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura).

De acordo com a assessoria da Terra de Direitos, “a contaminação genética das variedades tradicionais adaptadas aos biomas brasileiros e que aqui adquiriram características únicas, podem gerar erosão genética e silenciamento destas características, por conta de uma contaminação constante das sementes, de safra a safra, geração a geração. A homogeneização da base genética dos cultivos on farm das variedades de milho pode fazer com que o Brasil deixe de ser Centro de Diversidade desta espécie. Representa grave violação à tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e afronta direitos constitucionalmente conquistados, como ao patrimônio genético e cultural.”

Saiba mais:

Sementes tradicionais são mais resistentes às mudanças climáticas – O Brasil é considerado Centro de Diversidade do Milho, já que variedades únicas foram adapatadas aos diferentes climas brasileiros. A substituição gradativa das variedades crioulas ou tradicionais pelas variedades “modernas”, introduzidas a partir da Revolução Verde e potencializadas pela biotecnologia, resultou em uma padronização das espécies cultivadas e do padrão alimentar dos povos. Calcula-se que somente 30 espécies correspondam hoje à 95 % da nutrição humana, e apenas sete delas – trigo, arroz, milho, batata, mandioca, batata-doce e cevada – correspondam à 75% deste total. Nos países Latino-Americanos e caribenhos, a FAO estima que cerca de 70% das sementes utilizadas pelos agricultores sejam provenientes de sistemas locais, conservados dentro das propriedades.

As sementes produzidas e melhoradas pelos próprios agricultores possuem ainda outra característica muito valiosa: a fácil adaptação aos ambientes e solos adversos. Pelo fato de serem melhoradas constantemente no próprio ambiente em que são plantadas, as variedades tradicionais se tornaram mais resistentes às rigorosas exigências do clima e também às pragas. Por outro lado, a produção moderna e laboratorial das sementes prioriza características que atendem a uma demanda de larga escala, como a alta produtividade e boa resposta a uso de fertilizantes químicos. “Embora a conservação ex-situ (fora do ambiente) em câmaras frias garanta a existência e sustentabilidade de determinadas variedades frente à catástrofes ambientais (como tsunamis), em tempos de crise ambiental e alimentar, este forma de conservação on farm, ou seja, nas unidades produtivas pelos agricultores se tornam cada vez mais relevantes”, analisa a assessora.

Isolamento entre lavouras não garante coexistência – Desde a liberação do milho transgênico, diversas organizações vêm apontando a iminência da contaminação e a necessidade de fiscalização do cumprimento da norma, assim como do monitoramento pós-liberação comercial nos campos brasileiros. Apesar do MAPA afirmar que realizou 551 ações em 12 Estados, os técnicos da Seab não encontraram postos de fiscalização e os agricultores não cumpriram a exigência da bordadura. O plano de monitoramento pós-liberação comercial, que deveria ser feito por 5 anos pelas empresas e fiscalizado por órgãos competentes, não vem sendo feito, o que inviabiliza o monitoramento dos efeitos adversos da liberação da tecnologia.

A contaminação também levanta a questão das inúmeras liberações de transgênicos realizadas pela CTNBio sem passar pelo devido processo administrativo de avaliação dos riscos ao meio ambiente e à saúde, estabelecido tardiamente pela CTNBio ao editar a RN 5 apenas em março de 2008. A comissão quer flexibilizar a RN 5 para diminuir as exigências de estudos dos impactos dos OGMs. Tal fato traz grande preocupação diante do pedido deliberação comercial do arroz geneticamente modificado, previsto para ocorrer neste ano.

No caso do milho transgênico, a exigência de uma norma que garantisse a existência de lavouras convencionais, orgânicas e agroecológicas, surgiu a partir da pressão exercida por organizações sociais envolvidas no debate. Alguns membros da CTNBio, como o Ministério do Meio Ambiente, também foram contrários a liberação do milho transgênico e apresentaram estudos que apontavam a contaminação já em 2007. No voto do MMA já estava o alerta de que “o pólen poderia contaminar campos vizinhos em taxas duas a três vezes maiores do que se pensava originalmente”. No ano passado, a própria Seab apontou a contaminação genética, mas a União Federal voltou a reafirmar que a RN4 preservaria as características genéticas de cada variedade.

“Esse tipo de erro quanto ao estabelecimento da norma, e suas consequências, poderia ser evitado se a CTNBio seguisse os preceitos do Protocolo de Cartagena e da Constituição Federal quanto ao estudo de impacto ambiental e exigisse estudos do OGM nos diversos biomas do meio receptor previamente à sua liberação comercial, o que estabeleceria parâmatros mais reais par liberação e medidas suficientes para a contenção da tecnologia”, afirma Packer.

Saiba mais detalhes da pesquisa - A pesquisa identificou primeiramente locais onde seria possível testar a eficácia das regras de isolamento estabelecidas pela CTNBio. Um dos critérios foi selecionar áreas onde existisse uma única fonte de pólen transgênico, ou seja, onde se pudesse identificar qual lavoura contaminaria os milhos convencionais e a que distâncias.

A partir disso, os técnicos usaram o teste da fita para identificar quais lavouras eram convencionais e quais eram transgênicas. Em todos os casos, a variedade de milho geneticamente modificada cultivada foi a Yieldgard-MON 810. Depois, os técnicos coletaram espigas, produzidas pelas lavouras convencionais expostas à contaminação nas distâncias de 10 a 25 metros (isolamento), 30, 60, 90 e 120 metros a partir da margem da fonte de pólen transgênico. Em cada uma das faixas, foram coletadas e georreferenciadas 10 espigas potencialmente contaminadas de forma aleatória. As espigas coletadas foram testadas pelos métodos da fita e de PCR tempo real.

Leia mais em Terra de Direiros
http://terradedireitos.org.br/agenda/sementes-tradicionais-sao-mais-resistentes-as-mudancas-climaticas/

sábado, 17 de abril de 2010

Belo Monte: Aneel decide adiar o leilão


16/04/2010 - 04h04

Uma questão de coerência...

Após decisão liminar da Justiça, em ação movida pelo Ministério Publico (MP), contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), suspendendo o leilão da obra, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu adiar a disputa pela usina. As informações são do jornal Folha de São Paulo.

A Aneel informou que somente irá informar a nova data do leilão após obter outra decisão que derrube a liminar. O leilão estava previsto para acontecer na próxima terça-feira (20) e o prazo para o depósito de garantias pelos grupos interessados terminaria hoje às 18 horas, mas pode ser prorrogado.

Ontem, a Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu da liminar concedida pela Justiça Federal do Pará. O advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, chegou a afirmar que a Justiça decidiria em favor da União, já que, segundo ele, todas as questões técnicas levantadas na liminar já foram respondidas ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) durante o processo de licenciamento ambiental.


(Envolverde/Amazônia.org.br)

terça-feira, 13 de abril de 2010

Belo Monte. Um projeto que deve ser cancelado. Entrevista especial com Guilherme Zagallo



13/04/2010 - 11h04
Por Redação IHU


Na última terça, dia 06 de abril, foi divulgado o relatório Missão Xingu: Impactos socioambientais e violações de direitos humanos no licenciamento da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. A IHU On-Line entrevistou, por telefone, com um dos relatores do documento, o advogado Guilherme Zagallo, que falou sobre as violações deste projeto aos direitos humanos e os seus impactos para a população e o ambiente local. “O município deve dobrar de tamanho. Hoje são 100 mil habitantes, e está prevista a migração de mais 96 mil pessoas. Essas pessoas que migrarão, em torno de 17 mil no pico da obra, trabalharão na construção. Só que essas pessoas não têm a qualificação necessária para a operação. A operação da usina vai movimentar apenas 700 pessoas. Passada a obra, ficará um caos social no município”, explica Zagallo.

Guilherme Zagallo é vice-presidente da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do Brasil. É também relator nacional de direitos humanos da Rede de Direitos Humanos Plataforma Dhesca Brasil [1].

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O relatório recomenda, entre outras coisas, a suspensão imediata do leilão da usina...

Guilherme Zagallo – Foi solicitada, também, a anulação da licença prévia. Coincidentemente, o Ministério Público do Pará liberou um release, dizendo que está entrando com uma ação na justiça pedindo a mesma coisa, que a justiça determine a suspensão do leilão e a anulação da licença. E mais, que o Ibama se abstenha de conceder outra licença, sem que estejam sanadas as irregularidades apontadas.

IHU On-Line – E como o senhor vê a desistência da empreiteira Camargo Corrêa do leilão da obra?

Guilherme Zagallo – A avaliação que temos é que um dos consórcios envolvidos duvida da viabilidade econômica do projeto. Isso porque eles têm uma avaliação interna de que os custos envolvidos, os custos ambientais e sociais, são muito maiores do que aqueles reconhecidos pelo governo. Então, apesar de todas as vantagens que o governo disponibiliza, como financiamentos públicos a juros baratos e, inclusive, com subsídios, ainda assim o empreendimento teria um risco financeiro muito grande.

IHU On-Line – Em relação aos direitos humanos, quais são as principais violações que estão sendo cometidas na obra de Belo Monte?

Guilherme Zagallo – A principal de todas elas é a ausência de oitivas nas comunidades indígenas, um direito garantido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, e que foi ignorada pelo governo brasileiro. A Funai esteve fazendo algumas reuniões preliminares, quando o Enterprise Risk Management (ERM), ou Iniciativa de Gestão de Riscos, não estava sequer depositado. Ou seja, o projeto não estava finalizado, ainda estava em modificação, e dizia para as comunidades indígenas que não eram as oitivas indígenas da comissão 169. Porém, no processo do licenciamento ambiental, a Funai atesta que as oitivas teriam sido realizadas, juntando o ato das reuniões preliminares. As comunidades indígenas, no entanto, estão revoltadas com o tratamento que a Funai deu a esse caso.

A Funai tentou lavar as mãos dizendo que esta autorização estaria condicionada a segurança de que os povos indígenas não sofreriam impactos, mas o Estudo de Impacto Ambiental (EARIMA) reconhece que os povos indígenas vão sofrer impacto. Esta barragem será construída em um trecho que hoje é seco. Eles irão desviar a maior parte da água de um trecho de 100 km do Rio Xingu, na região de Altamira, e, nesta região de seca, existem duas terras indígenas. São terras indígenas que serão afetadas não pelo alagamento, mas pela seca permanente, que vai reduzir a quantidade de pescado e a biodiversidade de um modo geral. Há sim impacto nestas terras, e isso não foi reconhecido no processo.

Além disso, o governo subdimensionou no EARIMA, pela Eletronorte, a população atingida. Não foram consideradas as populações que vivem às margens desses 100 quilômetros, sejam as populações indígenas ou as ribeirinhas. A Eletronorte também não fez um estudo sobre índices isolados, e não existem indicações sobre isso. O hidrograma ecológico apresentado por eles, da vazão mínima neste rio que será desviado, não atende às necessidades dos ecossistemas da região, e sim as necessidades de geração de energia. Com certeza, irá haver uma extinção de espécies nesta região, que é muito rica em biodiversidade, e algumas espécies de peixes são endêmicas, só existem lá. Não foram analisados os impactos ajuzantes da usina. Logo depois da casa de força, há um dos principais pontos de produção de tartarugas da Amazônia, cujo impacto sequer foi analisado. Também não foi analisada a questão da migração sobre o desmatamento da região. Por todos esses motivos, concluímos, em nosso relatório, que esse empreendimento é inviável, do ponto de vista socioambiental, e pela saída de um dos consórcios. Provavelmente, até do ponto de vista econômico, esse empreendimento é inviável.

IHU On-Line – Como foi a reunião com a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados onde o relatório foi divulgado?

Guilherme Zagallo – Sentimos uma receptividade muito grande na Câmara dos Deputados da comissão. Inclusive, um fato interessante é que havia dois senadores presentes, um do Pará, José Nery, e um do Tocantins, Osmar Pitangueira. Isso não é muito comum nas sessões da comissão na Câmara. Porém, mais uma vez percebemos uma omissão do estado brasileiro. Nenhuma das autoridades convidadas do Ministério de Minas e Energia e do Meio Ambiente compareceu. Isto já havia acontecido na audiência pública convocada pelo Ministério Público Federal, em 1º de dezembro do ano passado. Ou seja, o estado brasileiro ignora e desrespeita o executivo e não quer debater com a sociedade, não quer expor seus argumentos de defesa dos projetos. Provavelmente porque sabe que é muito frágil a defesa desse empreendimento.

IHU On-Line – E como foi a reunião com Dom Erwin nesta quinta-feira, dia 08 de abril, pela manhã?

Guilherme Zagallo – A CNBB também tem posição contrária, e a conferência, inclusive, publicou uma nota pública contra este empreendimento. Dom Erwin recebeu uma cópia do relatório e está viajando para Roma, para uma audiência com o Papa. Segundo palavras do próprio D. Erwin, ele irá mencionar esse assunto com o Papa Bento XVI. Este é considerado, por ele um dos principais temas da audiência. A expectativa é que demos ao máximo a repercussão. A reunião está marcada para o dia 20, e esperamos que o poder judiciário, recebendo a ação que o Ministério Público do Pará está entrando na justiça, reconheça todas essas ilegalidades e essas violações aos tratados internacionais e à constituição, suspenda esse leilão e anule a licença prévia. Essas são recomendações que constaram também em nosso relatório.

IHU On-Line – Por que o senhor chama Belo Monte de “Usina Vagalume”?

Guilherme Zagallo – É porque o governo a divulga como uma usina de geração de 11.181 megawatts. Esta é a capacidade máxima de geração. Só que essa é a capacidade máxima quando se tem água para isso. O Rio Xingu tem uma variação muito forte entre as estações. A média, no período de seca, é de 1.065m³ de vazão por segundo. Na cheia, a média chega a 19.000 ou 20.000m³ de vazão. Esta usina só poderá gerar 11mil megawatts em três meses e meio por ano, mais ou menos. Na maior parte do tempo, ela gera valores inferiores a isso. Na média do ano, vai gerar em torno de 4400 megawatts, sendo que, nos meses de seca, que são dois pelo menos, ela gera menos de mil megawatts.

Há declarações do presidente da Petrobras dizendo que a usina pode ser sazonal, e, neste período de pouca água no rio, pode ser uma usina que funcione somente no período da noite, quando aumenta o consumo na região sudeste. Isto não está previsto no EARIMA, que não considerou essa possibilidade no estudo de impacto ambiental. Não está demonstrada, também, essa complementaridade que eles alegam nas suas falas, de que, quando Belo Monte tiver pouca energia, os sistemas sul e sudeste terão um volume maior de energia. Isso não está demonstrado e deveria ter sido analisado no estudo. Por esse motivo, chamamos de Usina Vagalume.

Neste ciclo de vida da usina, a cada cinco ou seis anos, haverá meses em que o volume de água no rio será inferior ao volume mínimo de água que teria que ser liberado para o trecho da vazão ecológica. Resultado: a cada quatro ou cinco anos, a Usina não gerará energia, porque não terá água suficiente para movimentar suas turbinas. A Usina de Belo Monte não gerará um volume firme de energia, nos quantitativos que o governo anuncia.

IHU On-Line – Em novembro, vocês realizaram uma missão especial na Volta Grande do Xingu para verificar os impactos que já estão sendo causados pelo projeto da usina de Belo Monte. O que vocês viram?

Guilherme Zagallo – O que vimos é uma apreensão por parte da população de Altamira. Dezenas de ruas, em Altamira, serão submersas em função da elevação da cota do rio na cidade. Ainda não está claro para a população quais serão essas ruas, já que o governo não fez uma divulgação disso. As pessoas não sabem quem irá perder suas casas. Nas comunidades ribeirinhas, ao longo do rio, há uma apreensão maior ainda. Porque esse rio, com essa variação tão grande entre verão e inverno, entre seca e chuva, vai passar a ter um verão permanente. As comunidades temem ficar isoladas. O principal meio de comunicação na região é o Rio Xingu, um rio com muitas cachoeiras, corredeiras, muitos pedrais e, com pouca água, irá dificultar muito o transporte da população. A pesca, uma importante fonte de subsistência dessas populações ribeirinhas, também será afetada. Por tudo isso, há uma apreensão muito grande por parte da população em relação à implantação desse empreendimento. Basicamente, o segmento que está apoiando a implantação da hidrelétrica na cidade de Altamira é o empresarial.

IHU On-Line – Quais os principais problemas no Estudo de Impacto Ambiental apresentado pela Eletronorte?

Guilherme Zagallo – O estudo é insuficiente em muitos aspectos. Muitas vezes ele não consegue atestar a viabilidade ambiental do empreendimento. A própria licença prévia, concedida pelo Ibama, tem quarenta condicionantes. Ou seja, se um empreendimento tem quarenta condicionantes, e, em tese, um empreendimento só pode ser implantado se adequado a essas determinações, é porque ele não é viável do ponto de vista ambiental. Dois dias antes da concessão da licença, os técnicos do próprio Ibama, em parecer público, sustentavam que não havia elementos suficientes para a atestação da viabilidade ambiental do empreendimento. Talvez, por esse motivo, essa licença gerou a demissão de um dos diretores do Ibama na época e de coordenadores da área de hidrelétricas. Foi uma licença concedida e arrancada com uma política muito forte, e não com obediência dos processos.

IHU On-Line – O impacto da migração de trabalhadores para a região não foi considerado pelo governo na concepção do projeto. Se a usina sair, como seria esse impacto?

Guilherme Zagallo – Eles reconhecem a migração, mas não dão nenhum tratamento a isso. O município deve dobrar de tamanho. Hoje são 100 mil habitantes, e está prevista a migração de mais 96 mil pessoas. Essas pessoas que migrarão, em torno de 17 mil no pico da obra, trabalharão na construção. Só que essas pessoas não têm a qualificação necessária para a operação. A operação da usina vai movimentar apenas 700 pessoas. Passada a obra, ficará um caos social no município. Como se trata de exportação de energia, e não há atração de empreendimentos para gerar empregos no município, restará um problema social terrível na região e, com certeza, resultará no aumento do desmatamento, da ocupação irregular de terras indígenas etc. Essa região já tem muitos problemas socioambientais, e a tendência é que esses problemas sejam enormemente agravados com a construção da usina.

O impacto de migração já está acontecendo. Na semana passada, o jornal O Globo fez uma série de reportagens, indicando que isso já ocorre, e que algumas pessoas já estão se dirigindo a Altamira na expectativa de disputar os empregos que serão gerados com a construção de Belo Monte. Esse é um dos maiores problemas dos grandes projetos. O simples anúncio do empreendimento já causa a migração, e o poder público quase nunca consegue controlar esse processo.

IHU On-Line – Como o senhor vê a campanha mundial contra Belo Monte, lançada pelo diretor de cinema James Cameron?

Guilherme Zagallo – Na década de 1980, houve uma primeira tentativa do governo de construir Belo Monte. Na época, houve uma personalidade do mundo artístico mundial, o cantor Sting, que deu declarações contra, juntamente com o líder indígena, Raoni. Isso teve uma importância muito grande. A imagem do Brasil certamente vai ser muito afetada com a construção desse empreendimento, seja pelo aumento do desmatamento ou pelo impacto das populações indígenas.

O diretor James Cameron, sendo um cineasta que já arrecadou uma das maiores bilheterias do mundo, e que, recentemente, dirigiu Avatar, que tem uma temática ecológica, é uma voz que será ouvida. Já tivemos, em 2009, novas declarações do cantor Sting, retomando sua luta e participação. Certamente a construção desse empreendimento contribuirá para o aumento da imagem negativa do país na área ambiental.

IHU On-Line – O que está em jogo, uma vez que os alertas e as manifestações surgem de diferentes partes, em relação à ideia do governo de continuar com o processo de licenciamento?

Guilherme Zagallo – O governo quer produzir energia para empresas eletrointensivas. A própria Alcoa [uma das líderes mundiais na produção de alumínio], que tem uma mina de bauxita no município de Juruti, já sinalizou sua intenção de construir uma fábrica de alumínio. 70% do custo de produção do alumínio é energia elétrica. O que o governo está sinalizando é que a finalidade da construção de Belo Monte não é para atender necessidades de um empreendimento que gera emprego, mas para viabilizar empreendimentos eletrointensivos na região.

IHU On-Line – Então, o modelo do projeto explica a opção do governo...

Guilherme Zagallo – Sim, a opção do governo é que o Brasil seja um fornecedor de produtos semiacabados. Vivo na cidade de São Luís, onde há 25 anos se mantém uma fábrica que exporta lingotes de alumínio de 45 quilos, sem nenhuma verticalização ou integração. Isso vai para a Europa, Estados Unidos e para a Ásia para transformação em produtos com maior valor agregado. Aqui ficamos somente com o problema ambiental dos poluentes que são emitidos e do consumo excessivo de energia, que faz falta à nossa população.

IHU On-Line – Que alternativa deve ser apresentada em relação ao projeto de Belo Monte?

Guilherme Zagallo – Belo Monte, na nossa avaliação, é um projeto que deve ser cancelado. O Rio Xingu tem peculiaridades muito específicas, que dificultam ou praticamente impedem que esse processo seja corrigido. Acho que um estudo de impacto ambiental mais detalhado vai concluir, com mais rigor científico e técnico, que é inviável a implantação do empreendimento naquela região. Por isso, essa pressa toda na concessão da licença e na pressão sobre o Ibama. Esse processo que, no nosso ponto de vista, não é possível ser consertado.

IHU On-Line – A partir da divulgação do documento, nesta última quarta-feira, quais são os próximos passos a serem tomados?

Guilherme Zagallo – Feito esse lançamento na Câmara, enviaremos cópias do relatório ao Ministério Público Federal, ao governo brasileiro, ao Ministério do Meio Ambiente, de Minas e Energia, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a todas as agências envolvidas, Ibama e Aneel. Também para as agências internacionais, à própria Organização Internacional do Trabalho, já que conta com uma possível violação a uma de suas convenções, às relatorias internacionais da ONU, relacionadas à questão indígena. O relatório será enviado a uma série de autoridades, nacionais e internacionais, solicitando a adoção de providências.

Notas:
[1] A Plataforma DhESCA Brasil surgiu como um capítulo da Plataforma Interamericana de Direitos Humanos, Democracia e Desenvolvimento (PIDHDD), a qual se articula, desde os anos 1990, para promover a troca de experiências e a soma de esforços na luta pela implementação dos direitos humanos, integrando organizações da sociedade civil de diversos países, em especial do Peru, Equador, Argentina, Chile, Bolívia, Colômbia, Paraguai e Venezuela.


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Legenda: Índios protestam contra Belo Monte

(Envolverde/IHU-OnLine)